Aprendendo a ser

Minha foto
Fá-lo-ei por eles e por outros que me confiaram as suas vidas, dizendo: toma, escreve, para que o vento não o apague.

26 de dezembro de 2008

Do Tempo e de outros esquecimentos

Eu, agora - que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?
Mário Quintana

Ouça-me bem, amor
Preste atençao, o mundo é um moinho
vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões a pó
Cartola O mundo é um moinho

Hoje olhei tua foto, tu não eras mais o mesmo, e eu, quem era? com apuro e com cuidado, como mandou o meu coração, como o compositor que escolhe minuciosamente a palavra pra canção,que é sua vida! eu procurei, procurei, encontrar-me contigo de novo, confesso que não te busquei com o mesmo ardor de outrora, é verdade, de quem idolatra a coisa amada, mas com o cuidado (que talvez contenha um quê de amor) de quem procura recuperar algo que o escapou vagamente no passar impiedoso dos dias e não imagines, meu bem, o espanto que me tomou a saber que tu, não eras tu.Confesso, busquei, busquei aquele sentimento, nos teus olhos, tua boca, teu tão amado sorriso, se ele ainda estava la, a me encantar em algum lugar recôndito do meu ser. Talvez o recalque o tivesse impedido de se mostrar vigoroso com fora um dia, mas eu me desarmei, procurei nas lembranças mais singelas teu afago no cabelo. E o assombro que me tomou de não encontrar vestígio que fosse da tua lembrança mais agradável foi como o susto de perder o fôlego inesperadamente. Porque com aquele sentimento uma parte minha foi amputada e eu presumo pesadamente ser do coração e esta, uma vez arrancada jamais se recompõe.

Da tua figura, eu sei, jamais esquecerei, mas do sentimento, e quando ainda do sentimento, pelo menos da intensidade dele e tudo um dia se passará sob a tênue linha da indirença. Tua voz antes sentida à distância, hoje..perdão! não mais é que um falar comum do estranho que passa ali na esquina a cumprimentar-se em tom displicente, que não carrega sentimento algum e nada mais me diz que um bom dia fulgas. Uma conversa que outro dia tu começaste displicente comigo, mas cuidadoso no trato de cada palavra que tu ingênuo ainda temes me causar qualquer vaga reação...não causou nenhuma emoção mais assim, ah e eu que nunca queria que algum dia nós tivéssemos uma conversa superficial. Eu apenas reagia aos teus espaçados estímulos, em outros momentos apenas balançava a cabeça em sinal de confirmação e tu foste morrendo também com a minha pouca reação que a tua convesa ao falar das amenidades do dia me trazia nada mais que tédio. Preferiria sofrer de amor que sentir-se indiferente, ouvira um dia essa frase e ela como num milagre dos pães se transformara em tantas palavras que embora perdidas um dia que serão, foram ditas e sentidas e isso já é muito por esse ainda pulsante coração, e isso já as eterniza, já nosso amor, é apenas um leve sopro que se extinguiu ao primeiro vendaval e se perdeu nas paragens do tempo, quem sabe um dia ele dobre alguma esquina em novo vigor e atinja certeiramente um coração quiçá tão sensível quanto o nosso foi um dia e tomado por nova força atinja um coração virgem e plante nele a tal da ilusão que nós, a muito, já teremos perdido.


O nosso amor se transformou em BOM DIA!!!

comigo nao seria diferente...

21 de dezembro de 2008

Que ja não é domingo...já é outro dia

E me entristreço com tardes de domingo em qualquer canto da terra.
Milton Dias

Hoje não sei se por ser domingo,
E que o domingo me lembra uma triste despedida
Que a vida é, que é a vida
Mas que nos domingos ela é mais
E as tardes então são um cais

Que me deu uma saudade das pessoas que eu perdi
Por não saber preserva-las
Ou elas a mim,
É...sentindo saudades, sim...
De todos, de mim
Dos amigos que se foram,
Mas que nem sei porque estão aqui...
É, ainda estão aqui.
E mesmo quando eu não quiser
Eu vou lembrar deles
E quem sabe eles de mim
Mesmo que eu os deconheça
E que eu me esqueça de como eram enfim
Do que faziam pra eu sorri,
Dos seus retalhos, dos seus frangalhos que se juntaram aos meus
Fazendo um cobertor
E como todos os cobertores, acolhedor
Que me diziam, no aconchego de um sorriso
Que eu não estava só
Eu não estava só

Que eu não fiz na intenção de um poema
Mas que magicamente em um esse texto se transformou
Que a poesia é o começo de tudo
E os meus sentimentos que pra transformar eu luto
Não mutam, continuam firmes, perseverantes a acreditar
Que ainda há, que ainda há em quem confiar
Se a minha rima não é rica, não me condenes no meu mal poetar
É sentimento puro
Mesmo eu não sabendo expressar

Eu vivo em carne viva, por isso procuro tanto dar pele grossa a meus personagens. Só que não agüento e faço-os chorar à toa.
(Clarice Lispector)

17 de dezembro de 2008

De um remoto Eu

Se só me faltassem os outros, vá, um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mais falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo.
Machado de Assis



pensei um dia doces sonhos de minha infância
Que as coisas boas me durassem toda a vida
Mas fui perdendo minha pequenas coisas boas sem me dá conta
E quando então, me dei conta, enfim me olhei
Não fui aquela que um dia desejei
E pelo braço, a mim mesma me tomei...
E no espelho, a mim, me reparei
Triste esboço de uma figura perdida

Me perguntei a mesma em vão...
Em que porão, em que rosto, em que esquina, em que portão...
Ficou perdido meu mais doce sorriso?
Ficou partida minha máscara mais antiga?
Virou espanto minha face envelhecida...
Virou doença minha alma partida
Virou cansaço minha busca nunca encontrada

E nos desenhos de criança eu me recordo
Sempre o sol amarelo a brilhar
E algumas aves no papel a voar
Se perderam como eu em cada idade
Que ja nao era a mesma daquele ano
Respondia pelo mesmo nome é bem verdade
Mas não se engane, meu nome já não é esse
Se ainda respondo pelo nome que chama, não é por convicção, é por pura comodidade

O futuro pesa toneladas sobre mim

Clarice Lispector

Talvez seja por isso mesmo que eu gosto mais de falar do passado...

14 de dezembro de 2008

Vivia tranquilamente
com esperança singela
tudo corria bem
a beleza era amiga dela

mas um dia sem querer
encontrou um belo rapaz
Parecia ter sido um encontro preparado
desses presentes que a vida
nos oferecem com se fossem planejado

tudo havia em comum
sorriso largo no rosto
brincadeira de alegria
um destino entrelaçado
pelas doces coincidências da vida

mas se sabe que quem ama
de vez em quando questiona
será que a amo tanto?
para passarmos a vida juntos

seu olhar o traiu em um momento cruel
e foi buscar outras venturas
desprezando aquele amor fiel

ela não quis acreditar
que o castelo desmoronara
mas via dia a dia o olhar dele se afastar
tão longe que chegou um tempo
em que ela não mais pôde alcançar

ele estava longe
agarrado a lábios que nunca quis beijar
só pela fria curiosidade
que o novo chega a despertar

ela também se perderia
em braços que nunca quis abraçar
mas teria que seguir a vida
então tentou a outro aceitar

se ele arrependera?
Isso resta saber...
Mas no peito de um
O outro vive a sofrer

Seus destinos ninguém sabe
Se perderam na vida a toa
Poderiam ter vivido um do lado do outro
Mas a dúvida impregnou suas almas de amargura e desconsolo

Conto essa parte da minha vida como um marujo conta seu naufrágio
Machado de Assis - Dom casmurro

11 de dezembro de 2008

Uma névoa de tristeza
Uma mágoa de saudade
Um sorriso sem beleza
E um choro sem vontade

Minha alma chora a queixa do abandono a dois
A solidão dos outros é o que pesa sobre nós
você me beija e logo após
desola um olhar distante
como se estivesse questionando
a sorte daquela escolha

Sabes, a escolha foi tua
mas questioná-la é impeto dos mortais
como se o mundo nos levasse para onde não quisessêmos
e depois amargurassemos nossa fraqueza em aceitar

Se essa moça não te agrada
e não é bem o que esperavas
o que esperas pra deixa-la ?
talvez outro venha consolá-la

Se não vier...o que importas?
Não te preocupes com a sorte dela
Ela terá o conforto nobre
Das lembranças do que viveram

Se uma outra te tocar
Com ternura igual a dela
Não demonstres comoção
Pela lembrança que tiveres

Fuja dessa lembrança
Como a água escoa no mar
Tu fostes barco à deriva
Que nunca quis aportar

Se vires em noite serena
Uma vela em pleno mar
Saibas,
É a esperança dela em ter-te de volta ao lar

Não fujas dos teus sonhos
nem sofra com causas perdidas
é sofrimento inútil
que sucumbe e só aprofunda as feridas

9 de dezembro de 2008

O Crucifixo

Era algo exagerante, mas não esqueças que era a emoção do primeiro amor
Machado de Assis
À principio, eu só conseguia distinguir por entre a gola da farda, um cordão preto. Nada mais. Nossa distância afetiva, que implicava em distância física, não me deixava ver mais nada. Mas esse fio preto dentro de sua blusa, misturada aos seus pêlos e, principalmente, perto do seu coração despertava em mim uma curiosidade incomum. O cabelo preto, os olhos pretos, pequenos e inquietos como quem anseia experimentar o mundo, o fio do cordão e a linha tênue entre mim e ele
Sentavámos juntos na mesma fila da sala de aula. Eu nao frente, ele atrás. Não sabemos, mas às vezes essa linha tão sutil entre o eu e o outro, entre o interesse e a indiferença, entre o amor e a amizade, só precisa de um simples passo para se desfazer. E essa linha de fato se desfaria à medida que nos aproximávamos.
Dia a dia a curiosidade se aguçava. Trocávamos sorrisos fugazes, olhares fugidios, procuras indecisas, palavras entrecortadas por silêncio contrangedor. Olhos pretos. Pequenos. 

Certa dose de uma malícia inocente. A curiosidade exacerbava a vontade de saber, de ir além daquela blusa, de encurtar nossa distância, de atravessar aquela sala, de descobri o olhar que se escondia por detrás daqueles óculos, de desvendar aquele mistério que me perturbava. Eu só queria saber que pingente estava pendurado na ponta daquele cordão. Só isso.
Foi-se chegando. Cada toque, uma nova sensação. Cada sorriso, uma esperança. Eu corria, eu chegava cedo. Eu passei a sentar atrás. Nossa! Aí eu dei muita bandeira. Eu fiz amizade com seus amigos. Eu queria vê-lo. E o cordão agora, era apenas uma desculpa. Eu já quase que podia distinguir aquele volume à altura do peito. Ele brincava, se esquivava, punha e tirava os óculos, conferia a carteira, me olhava como quem promete algo, mas não garante se vai cumprir. Tocava no objeto, puxava novamente o cordão para dentro da blusa. O olho era pequeno e ele fechava mais quando ria. Minha avó sempre dizia: "tenha medo de homem com olho pequeno!" Eu ria, eu me divertia, eu me envolvia cada vez mais nos laços daquele cordão. Parecia não ter fim a minha espera. Quase que se formava na minha mente relutante o formato daquele objeto, sempre tão perto do coração dele. Eu me consumia no meu processo de negação...Eu dizia para os outros: "É apenas um amigo" E para mim mesma: "É apenas uma curiosidade" Nada mais. Nos meus pedidos, eu pedia muitas coisas, mas temia pedir uma: o amor. Os pedidos dele, que talvez estivessem ligados àquele cordão sempre tão bem protegido, eu não sei, seus receios detectados por seus movimentos inquietos, também não.
Distraído, um dia, ele tirou o cordão de dentro da camisa e abaixou a cabeça como quem conversa intimamente consigo mesmo. O objeto era escuro, envelhecido, de madeira resistente. Uma cruz. Será que esse símbolo sempre carregará o peso de estar ligado à dor? A história que estava se anunciando prometia romper com isso, acreditava eu. A cruz casando com uma barba rala que anunciava timidamente entre umas poucas espinhas davam um aspecto muito bonito àquele rosto em formato romano.
Minha ansiedade aumentava, nossas afinidades me estimulavam. Eram tantas coisas em comum. Queríamos passar para o mesmo curso no vestibular, tínhamos o mesmo signo, erámos bons e solicitados pelos amigos no colégio. Nos entendíamos nas brincadeiras. Ríamos juntos, Até planejávamos trabalhar juntos ja que a profissão seria a mesma. O sorriso, antes fulgás, tornara-se largo e franco, o olhar fugidio agora encarava . O silêncio entre nós nao mais existia. O que antes era dúvida, transformara-se em certeza. Eu queria ir além, além de uma simples curiosidade. O motivo dessa curiosidade não mais existia. Nos meus pedidos agora, havia seu nome. Seu nome tornara-se doce, tão doce na minha boca, mas não sabia eu que ele também estava se tornando doce na boca de outra. E aquele crucifixo, que foi sendo descoberto com meus sentimentos jamais chegaria perto do meu coração como chegou do coração dessa outra, e eu constatei, amargamente, que a cruz continuaria carregando o estigma de alguma dor.







29 de novembro de 2008

Palavras Perdidas

Hoje eu quero somente esquecer.
Quero corpo sem qualquer querer.
Tenho os olhos tão cansados de te ver
Na memória, no sonho e em vão
Descansa coração-Fernanda Takai


No abandono dos meus dias
Sinto-te na paisagem porque passo
Porque já andamos por aqui, lembra?
Não...nem sequer lembras de mim
Que prendeste na doce prisão que foi o teu abraço
E que eu me tive presa e ele por vontade
Tudo em mim lembra você
agarrada às emoções
No toque do celular
Gravado a tanto tempo
Toda vez que tocava a canção tu estavas lá
E eu morria um pouco mais
Consumindo a mim mesma
Perdendo as forças que um dia deram impulso àquele amor
Hoje não preciso de forças
Não tenho a quem amar
Estaria certo Vinicuis de ter a solidão como o fim certo pros amantes
Já não sei rimar
Tu roubaste minha rima
Eu era vivo e breve em ti
Todas as minhas rimas eram crentes e ricas
Hoje são pobres e céticas


Agora nem sei mais o que querer E a noite não tarda pra nascer. Descansa coração e bate em paz

1 de novembro de 2008

Da dificuldade de entendimento

Por causa dessa solidão tão comum, que nenhuma palavra é capaz de remediar e tantas vezes, agrava
A bagagem do viajante - José Saramago



- Eu sei perfeitamente do que fala
Disse ele essa frase, seguro do que dizia
Lhe comovera sentir o peso de uma verdade
Que tantas vezes, por querer, se negava a ouvir
Mas a certeza do que não devia o fazia despertar
Talvez as palavras dela o fizeram acordar

Que a consciêcia falasse alto
bem verdade, ele sabia...
Que as escolhas determinam no fim quem serás
E as palavras com que tentas em vão remediar
Outras ditas sem pensar
E depois de dita não há mais que concertar
E tantas vezes há de agravar
E ficar gravada na mente como ofensa intencional
Sendo que só quis dizer uma coisa e garanto - não foi por mal!
Mas acabei dizendo outra que foi casual
E tu entendeste outra e essa foi fatal!

Os mal- entendidos criam brigas intermináveis
E vai tornando os sorrisos cada vez mais raros
E as palavras cada vez mais esparsas
E os olhares cada vez mais desviados
E as pessoas perdem pouco a pouco a capacidade que lhes era sublime
Seus sentidos eu diria até...
Que não há palavra qualquer
Que supere a solidão que nós é!


Ah! Se a gente já não sabe mais rir um pro outro, meu bem, então o que resta é chorar.
Los Hermanos - O vento

31 de outubro de 2008

algumas palavras pro futuro

Eu quero as minhas rugas
Os meus erros
Ter guardados comigo
Os meus pequenos segredos
Escondido mais ao canto
A caixinha dos meus medos

E quando mais tarde
Sem muito o que fazer
E então displicente como um cão deitado ao chão
Me encontrar a inevitável solidão
Procuararei um velho amigo
E sorriremos conversando numa tarde de domingo

E às seis, chegue a família pra jantar alegremente
E sorrirei contente
E nesse momento a Deus peço
Uma tarde de domingo
Sentada à varanda e no colo meu mais novo neto!

Eu sou nostálgica demais, pareço ter perdido alguma coisa que não se sabe e quando

Clarice Lispector

24 de outubro de 2008

Infância roubada

Não que ela fosse uma qualquer
Pra ele bastava - era mulher
Não tinha pai, não tinha mãe
Solta no mundo - que ingrata aurora!
Aceitaria a qualqur hora o que a vida lhe dera de esmola

Em tenra idade desamparada
Com um cuidado ja nao contava
Olhos perdidos na imansidão
E sentada na calçada
Aos passantes olhava com sofreguidão

Às seis ja procurava
Lugar seguro pra se abrigar
Enquanto os outros a espreitavam
Em sinal de desconfiança ficavam pra ela olhar

Relutava em morar com homem
Se tão menina ela ainda era
Pouco conhecia da vida
Mas de alguma forma ja previa
Que relação seria aquela

Ele dizia cuidadoso
Vou cuidar de ti como um pai
Mas alisava suas pernas
Ela arredia es esquivava
Não queria aquele homem
Mas algo o aproximava

Dia a dia ela fugia
Dormia cedo, se protegia
Fuga inutil ela sabia
Que cedo ou tarde ele a teria

Até que um dia sorrateiro
Da cama dela se aproximou
Afastou lençol, roupa tirou...
Dizia ofegante e com ardor
Peças tiradas uma a uma
Sem respeito, sem pudor
Aquele homem tirou o encanto da ingênua flor!

Da cruel indiferença

É proibido deixar os amigos,
não tentar compreender o que viveram juntos,
chamá-los somente quando necessita deles.
Pablo Neruda - É proibido



Já nem falo dos sorrisos dados em vão
Das palavras fúteis, displicentes, ditas sem compaixão
Já nem reclamo das presenças tão ausentes
Das guerras frias não-declaradas
De toda a má vontade
Das lágrimas disfarçadas

Já não me dói que não me olhes nos olhos
Também não tenho vontade de te encarar
A indiferença com que ages a por mim passar
Não me incomoda que te esqueças de quem eu fui
Sempre presente e pronta pra te ajudar
Senão te lembras, quem sou eu pra te lembrar?

Pois eu tive que pagar minha dívida de alegria a um mundo que tantas vezes me foi hostil
Clarice Lispector

Frustrante procura

A minha pobre poesia
Erudição não possui
É peça reles, vulgar...
Em decoração comum
É palavra fácil, fraca
Que não comove ente algum

Por vezes ainda tentei
Ler poetas renomados
Pra ver se a inspiração
Em sorte de principiante
ajudava a pobre poeta
Na busca da escrita errante

Não, não...a escrita não era pra mim
eu tentava inutilmente tê-la até o fim
Mas não, não, ela fugia decidida
Ela fugia sagasmente
Como foge de um predador
Um esperto colibrí

Como uma aranha fugidia
Escapa na sútil teia
A escrita de mim fugia
E eu resignada sabia - não, não a teria

Minha rima desgrenhada
A ninguém pode agradar
É dinheiro falso, sem valor
É flor de papel, não é flor
É ave presa sem direito a vôo
É casal separado, sem amor




19 de outubro de 2008

A inesperada renovação

"As pitangas, por exemplo, são elas mesmas
Que pedem para ser colhidas, em vez de amadurecer
E morrer no galho, virgens."

Clarice Lispector - Felicidade Clandestina

Seco, o pé de pitanga
Já não floria a muito tempo
A muzangra que as flores duravam mais de mês
Já não dava sinais de vida há muito tempo
Eis que a coragem invadiu-lhe o peito de vez
E correu para aguar com avidêz
Fruta e rosa, regar a raiz na aridêz

Passou o tempo
Ela não via resultado
As flores não pareciam reagir
E a pitanga não se punha a florir

Desiludida, ela pensou
- Que luta vã!
Nada de flores, nem frutos no meu jardim
Será que a beleza de mim se escondia?
E a vida um gosto não me permitia?

Dia a dia a luta continuava
Com o balde e mangueira a regar
Até que um dia, displicente que estava
Achava mesmo que nada ia melhorar
E numa manhã, saindo à porta, se espreguiçar
Eis que as pitangas lhe sorriram do pomar
E a muzangra do jardim a lhe olhar
Como quem agradece com o seu belo verdejar
E com o cheiro pela casa a exalar
Parecia silenciosamente falar
- Obrigada por em nós acreditar!


-"Eu não espero flores ou algo do tipo...
-Mas eu meio que imaginava flores"...




Palavras vãs




"e eu que chamava de amor, a minha esperança de amor"
Clarice Lispector


Sim havia em mim ainda um quê de amor
Desiludido é bem verdade, mas se chamava amor
Que palavraa tão lindas ouvi um dia
Em pouco tempo, não...não foi verdade
O que tua voz me dizia a sussurar
Era só vestígio do que tu dizias sentir
Do que forçavas tua voz a dizer
Pra que dissestes entao, senão sentias bem querer?

É certo, tola eu fui de acreditar
Era a primeira vez que o amor me sorria
E ouvindo palavras tão bem articuladas
Estava sóbria, me recusava a acreditar
Mas tantas vezes tu disseste com certeza
Que as palavras conseguiram me inebriar

Amor vão, em pouco tempo se acabou
E eu comecei, a pensar
Que o que cremos durar uma vida inteira
Às vezes não alcansa uma esquina dobrar

A fugacidade das pessoas, dos sentimentos
Me parece igual a incerteza da flor
Num dia acorda esplendorosa
No outro dia o sol lhe verte a copa com dor

Não, não te culpes, vás em paz
Já não freqüentas os meus sonhos infantis
Já nãio verto as lágrimas que um dia
Eu verti...com pena de mim, por ter perdido a ti.


"Você disse que me amaria até morrer, e até onde eu sei, você ainda está vivo."

18 de outubro de 2008

Eu sempre fui poeta

Cada palavra é uma borboleta morta espetada na página por isso a palavra escrita é sempre triste
Mário Quintana



Eu não sabia que esse dom em mim morava
Por tantas vezes cheguei a duvidar
Entre os sorrisos que aos outros distribuia
E as lágrimas que, insistentes me caíam
A leitura e a escrita - quem diria que aos poucos elas me renovariam

Nas tardes de domingo
Nada a fazer
Não havia com quem conversar
Um desabafo, eu sei, eu não podia
O peso do silêncio, pouco a pouco insiitia

Entao pensei o que poderia fazer
Para a solidão dessa tarde aplacar

Pensei comigo - pôr no papel meus sentimentos
Eis que os versos se puseram a rimar

Tentei conter a angústia, a surpresa
Que de mim saia em forma de pobres rimas
Pobres-rimas-tristes era tudo que eu podia dar
E como um rio a desaguar em pleno mar
Aquele instinto eu não sabia controlar

A rima findou-se
Quando eu mal podia esperar
E que surpresa eu pude vislumbrar
Um poema de lamento ao meu penar
Olhei o céu e pra surpresa do meu eu
O sol distraído ja encostava no mar
E por um instante aquela tarde, outrora triste
Era a descoberta de um poeta, numa tarde de domingo

Dúvidas

Havia coisas que eu não entendia...e talvez jamais entenderia
Por que as pessoas mudam tanto a cada dia
Por que o sorriso muda tanto -
dissimula
Por que aos poucos diante das coisas que um dia
acreditei
Eu vou aos poucos mudando minha postura?

Por que as frutas só põem na estação?
Por que as aves escondem seus ninhos queridos?
Será que a felicidade só é possível às escondidas?
Em tempo, em lugar certo...

De preferência, longe dos olhos alheios
Que de alheios nada têm - Somos iguais
E as diferenças entrepostas no olhar
Que diz os sentimentos revelar
E as mesquinhezas a encobrir, a forjar

Tantas dúvidas haviam em mim, em mim, menina
E tantas delas eu jamais descobriria
Tantos segredos obstinada eu guardava
Como diria Oswald Montenegro
- Hoje são bobos, ninguém quer mais saber

Por que ainda tento entender as pessoas
Por que me lamento todo dia
Por que luto por
causas ja perdidas
Por que choro tanto com as partidas
Por que sorrio com as chegadas
Por que só me sinto em paz na minha morada
Por que insisto que é possível ser feliz
Por que ainda sonho com o verdadeiro amor
Por que quero debelar de mim
toda dor

Se nada disso eu posso evitar
Sou tão pequena diante das circunstâncias
Como uma árvore em pleno pomar
Cujas as raízes firmemente presas
E os galhos sonhadores a voar
Assim minha mente não quer aceitar
Mas para o chão me ponho a olhar
Pra me lembrar da crua realidade
E que nada eu posso controlar


11 de outubro de 2008

Da fuga de si mesma



Tenho fugido durante todo o dia daquela que perceberia, numa palavra, mesmo displicentemente dita, numa nuance de humor, numa tristeza mal disfarçada, numa mágoa incontida, numa dor não recuperada, que por mais maquiada que fosse, não, não tinha...ela perceberia...
Horas a perder de vista no espelho, procurando, procurando....tentando, inultilmente, encontrar aquele sorriso de princesa, ou mesmo uma expressão neutra, que é o que aprendemos de menos superficial com as pessoas, superficiais que elas são, uma expressão qualquer que fosse, ora mais, mas que tirasse aquele ar de quem estava cansada demais, frustrada demais...essa expressão, que nem sei como, se instalou naquele rosto.
Eu peço à pessoa da qual tenho fugido, que perdoe o riso gratuito e a alegria postiça, que escondia uma tristeza tão grande, que ninguém nunca suspeitaria e, que, por tantas vezes fizeram as pessoas dizerem: 'você sempre está tão de bem com a vida' E ela respondia com um sorriso, que afinal, ela, triufante confirmava que conseguia convencer a todos.
Naquela noite, enquanto a casa dormia, ela velava e por fim, se rendia em confidência a quem durante a vida de virgília, ela negava encontrar.
Fugir de si é a mais fraca e vã covardia, e nessa fuga errante, sem êxito, inclusive uma fuga de tudo mais que a atormentava, fuga daquela família feliz. Tantas vezes, quando parecia vencer, ela ainda estava ali, parada, olhar vago e perdida, feito menina do pré-escolar, esperando que alguém viesse buscá-la.
Quando um dia essa fuga se realizasse bem sucedida, ela seria outra que não ela mesma, assim como a menina do conto Restos do carnaval.
Toda fuga, mais frustrada que seja, pressupõe um encontro com que quer que seja, até mesmo com o oposto do que se quer encontrar.

5 de outubro de 2008

Liberdade

- Nao se preocupe, você ainda vai voar
Mas nesse dia, você vai estranhar!

Ele falava de liberdade
Como quem lamenta uma condenação
Que recai como um desamparo
Como um laço a se desfazer
Sem braços pra reerguer!

E na saudade ele falava de tudo
Até as broncas do pai falta lhe fazia
Liberdade e solidão
Combinação que eu nao imaginaria

Com linhas que eu encontrava pelo chão
Pequenas aves eu desenhava
Talvez a antiga aspiração
Que o iconsciente me revelava

Falou-me ainda de coisas
Já tão sabidas
Mas ao ouví-las de novo
Tão novas se tornariam
Me pareciam novas e antigas
Tão lindas, revelativas...

Se nossas vidas são tecidas
Pelo fio dos nossos sonhos
A verdade a bem dizer
Que outros fios se entrelaçam
Á nossa bela tessitura
Rompem com nossa costura
Misturam tudo, tudo, tudo...
Amarrotam todo bordado
Entrelaçam fio dourado
Com o rústico algodão
Desfazem os sonhos da gente
Destecem sem compaixão



"O homem está condenado a ser livre."
Sartre

Da limpeza dos armários







Com cuidado vou deixando
Todos por quantos ja passei
Os sorrisos se esvaecendo
E o meu rosto vai dizendo
Um displicente e triste adeus

Eu preciso limpar o armário
Tirar da gaveta velhos amigos
Ligar pra aqueles com quem há tempos não falo
Reviver os sorrisos que há tempos não dou
Oferecer aos outros um pouco do que eu sou

Abri uma gaveta
Encontrei um colega de infância
Sorrindo comigo na foto
Será que ainda lembra
Se passar por mim na rua?
Será que ainda sorri
Se me achar numa foto sua?

Lembrará das brincadeiras?
Dos gracejos que um ao outro fazia?
Ou será um mero estranho
Que passou por mim na rua um dia?

Uma cartinha, veja só...
Que eu fiz para a professora
Um sorriso ela me deu
Poderia descrevê-lo agora

Escondido mais ao canto
O diário confidente
Amigo de tantas horas
Leio e mal reconheço
As palavras que um dia, inocente eu proferi
Será que mudei tanto
Que nem lembro o que escrevi?

Dentro de um livro
A foto da família
Em pequena eu não sabia
Como pouco a pouco
Eu deles me distanciaria

Vou achando entre os guardados
Os vestígios do que eu era
Minha família, meus amigos, meus sorrisos, meus escritos...
E o tempo que diz que as dores cura
Também é veneno que as distâncias aprofunda

Entre a lembrança que se vai
E os papéis tão delicados
E também tao delicados
Nossos laços se mostraram
Tão frágeis se fariam
Inocente eu não sabia
Que tudo seria lembrança um dia

Hoje só papéis achados
E velhas fotografias
Escritos velhos, desbotados...
De nada me serviriam
Deixei-os ali no armário
Não quero lembrar que um dia
Fui menos só e menos triste
Eu tive um pouco de alegria


" O que é verdade permanece"
Spinosa

27 de setembro de 2008

Da bravura derrotada

"Mais cresce a luz, mais aumentam as trevas das
nossas descgraças. "
Shakespeare, Romeu e Julieta,


Se havia de me ser tão grata
A surpresa que naquele dia se faria
Também haveria de ser triste
A lembrança que a surpresa traria

Uma andorinha a voejar miha janela
Entrou no quarto se pusera a pular
Por entre os móveis brincava alegremente
E eu ternamente a lhe olhar

Eis que outras asas pairaram sobre o ar
E num susto que eu mal pude controlar
Um morcego a viria atacar

Brava andorinha!
Se pôs a lutar
E o morcego que as artimanhas da caça tão bem conhecia
Em poucos instantes
À andorinha desferia

Minhas mãos desesperadas
Puseram-se a lutar
Mas o ar tão maior que as minhas forças
E o morcego levara sem esforços
A andorinha, que em inocência juvenil
Trazia a mim um pouco de alegria.



Das dores alheias

A dor do outro que fosse dor profunda
Doeria em mim
Que sempre me sensibilisou o sofrimento alheio
Mas que a cruz do outro nao se faz minha
E ajudá-lo a carregar e ato de nobreza
Mas carregá-la é a extrema pobreza

Quando mais tarde, reerguido
Finalmente se revela quem tu eras
Espantada eu descubro ser em vão
A fiel ajuda que meus braços te deram
Eu sinto que a amizade foi um leão
Leão altivo que nem um sorriso emprestara
Quanto mais uma tola retribuição

Da finitude das coisas

Tudo acaba, isso é uma velha verdade, leitor. Nem tudo que dura, dura muito.
Machado de Assis

Andei revisitando meus guardados, meus papéis antigos, escritos e reescritos, minhas fotos antigas daqueles rostos tão bem conhecidos e daqueles que eu nunca mais vi, e daquele que eu poderia tão bem definir, mas que me aparece desbotado como imagem envelhecida, talvez o meu...
aquele rosto vivo e sorridente foi morrendo nas fotos que eu guardei, esquecidas nas gavetas tão perdidas do meu quarto que em bagunça transformei.
Se existe uma causa de ficarmos mais sentimentais no dia do nosso aniversário, eu nem sei, mas que algo diferente ocorre nesse dia, disso eu não posso escapar.
Esperar que os outros venham a se lembrar do dia no meu nascimento é o maior presente que a gente espera ganhar nesse dia.
Telefonamas, mensagens de que eu nem esperava mais nada, visitas com abraços de carinho, sorrisos paralelos e tímidos, coisas que me fizeram mais feliz. Eu preciso de tão pouco pra ser feliz e isso as vezes me espanta, porque me faz pensar que eu sou de alguma forma medíocre, porque eu me contento com pouco: nos raros sorrisos que eu vejo hoje em dia no rosto das pessoas, nas esperanças que planto nelas, nos meus falares de esperança, nos meus otimismos desmedidos e por vezes que nos quais nem eu mesma acredito.
Vejo passando por entre os meus achados e perdidos minhas lembranças mais remotas e recentes. Nao sei porque tenho essa memória tão profunda, que lembra de frases inteiras que as pessoas me disseram, que é capaz de lembrar de longas conversas, independentemente do valor da conversa, desde a trivialidade até à que mais me comoveu.
Lembro que um dia ouvira alguém dizer que enquanto eu ainda vir Deus no outro nada estará perdido, eu nao consigo de deixar de ver Deus no outro, por isso me é tão doído ficar parada diante de olhares distantes, sorrisos sem graça, lágrimas disfarçadas. Quereria eu que os meus papéis avulsos fossem puros como um dia de aniversário de uma criança feliz com todos os seus parentes a amigos na sua casa, sorrindo alegremente e tirando os retratos que eu um dia olharei nas velhas gavetas displicentemente.